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quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

A real importância


 
A música estava alta, e estava longe de ser de boa qualidade.
Há alguns dias atrás já tinha reparado nele, conheci ele há alguns anos antes, era um colega como todos os outros.
Alguma coisa me chamava à atenção.
Bêbados, todos eram incapazes de diferenciar certo do errado, do humano e do imbecil, estava sentada, com a cara amarrada, alias, era de se esperar, a bebida transformava as pessoas em simples bonecos de ventrículo sem raciocínio nenhum.
Ele, ah... ele era diferente, com sua cerveja, seu bom humor e sua guitarra, sentara ao meu lado e perguntou: “Você está brava?” e eu em meu profundo ódio apenas o respondi, “Não”. Ele então não satisfeito disse que iria tirar uma foto para eu conseguir ver minha própria face de raiva, foi ai, exatamente aí, que me toquei que ele poderia enxergar a alma, a minha alma, e não o meu corpo.
Brigas irracionais, sentimentos irracionais, nos levaram a uma delegacia, foi onde passei uma noite toda ao seu lado, não a sós, mas próximos o bastante pra enxergarmos aquilo que eu acreditava não existir, a alma.
Dias intermináveis, noites mais ainda, minha vida parecia não ter sentido algum, nada era como eu imaginava, meu coração que não batia voltou a bater, sem ao menos eu entender o porquê, as músicas tinham outro sentido, mas eu me recusava aceitar que era verdade, que eu não queria estar ali, queria estar nos acordes de sua guitarra, no tom suave da sua voz, talvez até em suas composições.
Os amigos sem a presença dele não passavam de apenas pessoas sem brilho nenhum, tudo mudava quando ele estava perto de mim, mesmo negando, sua presença fazia com que o rumo da minha vida enxergasse um sentido em todo o mundo.
Cegos, todos eram cegos, eu não era capaz de mentir, de esconder o que estava sentindo, alias, creio que não se tratavam de cegos e sim de pessoas incapazes de ver e entender o brilho de um olhar, do perfume de uma alma, da vida se tornando bonita e do sentido fazendo parte de cada minuto do meu dia.
Final de semana todos nós nos reuníamos, em um deles, todos novamente bêbados e impassíveis de sentimentos dormiram, foi quando um filme qualquer me fez ficar ao lado dele a noite toda, quando sua risada e seu sorriso entravam em minha mente, como um filme em câmera lenta, pego em sua mão, foi a sensação mais indescritível que tive até hoje, fiquei deitada no chão duro, com poeira, bem em frente a televisão, sabia que alguém poderia acordar e estragar aquele momento, mas isso não fazia diferença alguma, só queria estar ali, só queria segurar em sua mão. Por fim, amanheceu, enquanto todos dormiam, tive que o levar até o portão, onde sua mãe o esperava para ir até o aeroporto, no simples tchau, senti que ele também havia sentido a real importância daquela noite, que não era somente eu que estava mudando minha vida por sua causa.
Novamente os dias passavam, mas passavam demoradamente, como um poema sem fim, como um filme onde cada detalhe te preocupa, onde sua cabeça não para por um minuto se quer, onde o medo de mudar sua vida inteira toma conta de todo o seu corpo.
Puxando pela memória, lembro-me do dia que realmente senti que éramos mais do que apenas dois conhecidos, estávamos na porta de uma balada qualquer de São Paulo, eu estava com um tédio imensurável, não queria estar ali, meu bom gosto musical falava mais alto do que qualquer sonho de uma bandinha dar certo tocando músicas brega dos anos 80, estava tomando um ar, quando ele de repente parou ao meu lado, e conversamos, foi aí, exatamente nesse momento que o ar de sua presença se destacou dentro do meu peito.
Eu já trabalhava, tinha meu próprio dinheiro, já sabia o que queria estudar, mas nada na minha vida é tão fácil, quando tivesse oportunidade o faria com toda certeza.  Hora por hora, dia por dia, eu só queria resolver isso, sair gritando para o mundo todo que o queria, queria para a vida toda.
Mais uma noite com os amigos, e como não tinha ninguém em minha casa, chamei todos para dormirem lá, e isso foi o que todos fizeram, menos eu, e muito menos ele, peguei em sua mão, teria que trabalhar no dia seguinte, mas pouco me importava, queria estar ali, dormindo com ele, sentindo seu cheiro, pedi um beijo, mas as circunstâncias fizeram o resistir. O dia novamente amanheceu rápido, e no peito a mesma sensação que ele apenas sentia, aquilo que não dava para negar, aquilo que faziam as coisas mais bonitas, aquele afeto que não tinha aonde se esconder.
As pessoas ao meu redor se fingiam de desentendidas, mas todos já imaginavam que era aquilo mesmo que estava acontecendo e não daria para sustentar por muito tempo.
O que me atormentava era imaginar, que poderia estar matando outra pessoa com isso tudo, mas como matar o sentimento que nunca existiu? Nunca segurei em alguma mão que não faria eu cair, nunca olhei dentro de qualquer olhar e vi minha vida inteira, nunca senti que poderia fechar os olhos e dormir tranqüila enquanto alguém me protegia, então não estaria matando sentimento algum, fui em frente.
Coragem, assuma aquilo o que quer, as 24 horas do dia isso batia e rebatia em minha cabeça, mas não tinha a certeza que a outra parte sentia o mesmo, se a outra parte tinha a certeza de que se o amor existe, ele poderia acontecer apenas uma vez, e estava ali, querendo nascer.
Uma amiga com problemas sentimentais veio em fazer companhia, conversamos muito, até que perdemos a paciência com aquilo que não nos fazia bem, combinamos de sair, mas antes de nossa saída, na internet, nada de olhares, palavras, cheiros, admiti tudo o que sentia a ele, e tive que resposta que esperava, que seus braços estavam abertos para os meus.
A noite que seria de total bebedeira, diversão e qualquer outra coisa, caiu por água abaixo, só queria ele, só queria estar com ele, resolvendo todos os outros problemas de minha vida, enquanto ajudava minha amiga, que no fundo só queria sentir o que eu estava sentindo naquele momento.
Por mais que eu estivesse brava com outra pessoa, a noite foi maravilhosa, deitei pela manhã, e meu travesseiro nunca antes tivesse me visto tão feliz e completa, nesse momento acho que sabia o significado da palavra felicidade.
 Estava me sentindo viva, nada poderia estragar aquilo, não poderia fugir, era o meu destino, aquele olhar era meu destino.
Outra noite com os amigos, dessa vez no território dele, dois dias seguidos lá, quando todos se divertiam, bebiam, fumavam, eu o olhava e sabia que apenas por aquele olhar, era o meu abraço que ele desejava.
Aquilo ardia, machucava, dilacerava o meu coração, aquela vontade súbita de o abraçar, de saber ao certo quem era ele, o que pensava, como agia, não estava suportando; foi quando tive a idéia de preparar alguma coisa para comer, ele como dono da casa deveria me ajudar.
A sós, aquilo que ardia em meu peito não podia ser controlado, não poderia de jeito algum ser , tudo era real, tudo estava ali, diante do meu ser, foi quando ambas das partes não resistiram, o nosso primeiro beijo aconteceu, com toda certeza que possa existir no mundo o meu desejo era de que o tempo poderia parar ali, o mundo poderia acabar, tudo poderia deixar de existir, eu estava completa.
E como tudo tinha que acontecer como uma boa novela mexicana, as pessoas entram na cozinha e acabam presenciando tudo, brigas, discussões, mas em momento algum arrependimento. Nunca derramei uma lágrima se quer com honestidade e pureza, então estava mais do que na hora de corações serem partidos, amizades serem comprovadas e acima de tudo, as vidas tomarem seus rumos certos.
Após todo o falso drama, ficamos a sós novamente, intenso, não consigo descrever em palavras, mas a que consegue se aproximar é exatamente essa, intensidade.

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